Charles Lenzi, presidente-executivo da Abragel
Nenhum país do mundo tem os recursos naturais e o potencial de gerar energia elétrica de forma limpa e renovável como o Brasil. Por isso, nossa responsabilidade de ajudar o planeta é enorme. Como a nossa matriz elétrica é predominantemente alimentada pela geração hidrelétrica, nos destacamos como líderes na produção de energia sustentável.
Contudo, diante dos desafios contemporâneos e das mudanças no cenário energético global, a busca por um equilíbrio entre fontes intermitentes, como eólica e solar, e a necessidade de manter a segurança e confiabilidade do sistema elétrico tornaram-se cruciais.
O Brasil iniciou sua jornada na geração de energia elétrica com um foco significativo na hidrelétrica, aproveitando o vasto potencial hidráulico disponível. A decisão estratégica de explorar essa fonte renovável pavimentou o caminho para uma matriz elétrica limpa.
Nos anos 2000, o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) impulsionou a diversificação, viabilizando projetos de geração eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas.
O crescimento expressivo das fontes eólica e solar nas últimas décadas reflete não apenas a abundância e qualidade dos recursos naturais brasileiros, mas também o aumento da demanda por energia, a busca por diversificação de investimentos e a adesão aos compromissos de tranição energética. No entanto, o desafio é manter o equilíbrio na expansão da matriz elétrica, reconhecendo a natureza intermitente das fontes eólica e solar.
Neste cenário desafiador, as hidrelétricas têm atuado como protagonistas fundamentais para o sistema elétrico, pois continuam fornecendo flexibilidade operativa e garantindo a segurança energética.
O Brasil possui um vasto potencial inexplorado em centrais hidrelétricas de pequeno porte, distribuídas estrategicamente pelas diversas regiões. Isso não só otimiza o sistema de transmissão, reduzindo perdas, mas também oferece uma solução eficaz para a intermitência das fontes renováveis.
Contudo, a visão de uma matriz elétrica predominantemente limpa e renovável enfrenta diversos desafios. A abertura do mercado e a ênfase no preço como único indicador de valor podem, por exemplo, comprometer a integração eficiente de fontes diversas. O planejamento estratégico, que historicamente desempenhou um papel ativo na configuração da matriz elétrica, agora precisa se adaptar a um ambiente mais dinâmico.
Recentes publicações, como o relatório da International Renewable Agency, ressaltam o papel vital das hidrelétricas na transição energética global. Dobrar a capacidade instalada de hidroeletricidade até 2050 é apontado como um passo decisivo para atingir as metas climáticas.
Além de gerar energia limpa, as hidrelétricas contribuem para a estabilidade dos sistemas elétricos, fornecendo serviços ancilares, de modo a garantir que o sistema elétrico funcione de forma adequada, da geração ao consumo, assim como gerenciamento eficaz da água e benefícios socioeconômicos.
No estudo “O papel das hidrelétricas para segurança energética”, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) destacou oportunidades significativas para a expansão da geração hidrelétrica no Brasil. No entanto, isso demanda reformas regulatórias que garantam segurança jurídica e remuneração adequada para os serviços ancilares oferecidos.
As Centrais Hidrelétricas de Pequeno Porte (empreendimentos até 50 MW de capacidade instalada), localizadas próximas aos centros de carga, destacam-se como agentes eficazes na promoção da estabilidade do Sistema Interligado Nacional.
Na outra ponta, essas infraestruturas promovem mais oportunidades de trabalho para as comunidades locais, gerando renda e desenvolvimento humano, ingredientes fundamentais para combater as desigualdades sociais.
Portanto, em um cenário onde diversificação, sustentabilidade e confiabilidade são aspectos imperativos, a visão de uma matriz majoritariamente limpa e renovável para as próximas décadas depende do investimento sustentável em geração hidrelétrica.
Somente ao equilibrar as fontes intermitentes com o suporte das hidrelétricas, o Brasil poderá, definitivamente, continuar desempenhando o papel de protagonista na transição global para a energia sustentável.